Seria o Estado laico um Estado vadio?
Por Rubens Teixeira em 26 de agosto de 2013
O povo brasileiro, aos moldes
do que tem ocorrido em todo mundo, resolveu pautar diretamente seus
pleitos mais variados. Não são novidades na história das sociedades
movimentos de larga abrangência. No passado, alguns movimentos marcaram
época e foram importantes para se estabelecer quebras de paradigmas.
Podemos destacar a Revolução Francesa, movimentos como o Primeiro de
Maio de 1886, a Revolução Americana, e, em período mais recente no
Brasil, o movimento das Diretas Já. Uma grande diferença entre os
movimentos tradicionais e os que vêm ocorrendo no Brasil e no mundo é a
diversidade de pleitos e de grupos, havendo, inclusive, pleitos
divergentes entre si. Outra diferença, que abordarei com mais ênfase
neste artigo, é a preferência por instituições do Estado em proteger os
direitos de uns em detrimento de outros.
A Constituição Federativa do Brasil
(artigo 1º, parágrafo único), prescreve que “todo o poder emana do povo,
que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos
termos desta Constituição”. A forma mais tradicional de exercício do
poder pertencente ao povo é a indireta. Quando a sociedade resolve
pautar de forma direta e incisiva os seus pleitos está dando um recado
muito claro aos seus representantes: está desconfortável com a forma que
vem sendo representada. Há uma crise de representatividade.
É como um
carro em que o motorista perde o seu controle em uma curva. A primeira
ação a ser tomada para que a coisa não se agrave é tentar retomar o
controle da direção do carro. No caso da representação política, o
primeiro passo é retomar a credibilidade dos representantes, o que pode
ser feito mudando o sistema para dar ao povo o sentimento de que está
sendo bem representado. Isso deve ser feito por meio de uma reforma
política.
Com o grito de que políticos não o representam, será difícil
essa retomada. Em uma democracia, o povo precisa aceitar seus
representantes. Essa aceitação ocorrerá a partir do momento que os
cidadãos entenderem que suas vontades estão sendo prestigiadas, não as
dos representantes que sejam contrárias às populares.
Nas manifestações, realizadas por
pessoas, em sua maioria, pacíficas, a polícia se vê pressionada a
restabelecer a ordem e o faz da forma que entende ser mais factível. Se
por um lado as instituições de segurança cometem excessos, na maioria
das vezes quando encontram criminosos que jogam coquetéis molotovs,
pedras ou agem de forma violenta contra os policiais, por outro, em
maior escala, esforçam-se por cumprir seu papel e os policiais defendem a
sociedade ordeira com suas próprias vidas. Instituições, como, por
exemplo, a OAB, muitas vezes se colocam, teoricamente, na defesa dos
manifestantes.
Contudo, esta opta por não se pronunciar de forma clara
sobre os criminosos que atacam a polícia e atrapalham as manifestações.
Oferece “ajuda” aos atingidos pela violência policial, mas não oferece,
por exemplo, assistentes de acusação nos casos de “manifestantes” que
cometam crimes de ação pública que põem em risco a integridade física e
vida de manifestantes pacíficos e policiais. Não oferece ajuda também às
famílias de policiais que perdem a vida e têm seus direitos violados
pelo poder público, ou mesmo defende de forma efetiva policiais feridos
em combate que sofrem, em muitos casos, duras consequências pelo
desprezo dos seus direitos.
De qualquer forma, a violência policial é
um tema que a todos preocupa e deve ser combatida de forma sincera e
racional. Como, conceitualmente, o monopólio da violência pertence ao
poder estatal, evidente que este, para não violar direitos humanos, deve
ter limites muito claros. Para evitar que os limites “morais”, “éticos”
ou “políticos” impostos às instituições que cuidam da segurança pública
impeçam ou limitem suas atuações de defesa dos cidadãos de bem, o tema
deve ser avaliado de forma madura e equilibrada.
Na busca da evolução
desse tema, alguns projetos de leis tramitam no Congresso Nacional. Dois
projetos se destacam por terem sido apresentados antes das
manifestações recentes. O primeiro deles é o PL 6125/2009, do senador
Marcelo Crivella, que disciplina o uso de cassetetes e armas
perfurocortantes pelos agentes de segurança pública, nas atividades de
policiamento ostensivo, em todo território nacional, obrigando os
policiais a registrarem os casos específicos em que precisaram usar o
material e provocaram lesão corporal. Este projeto de lei já foi
aprovado no Senado Federal e agora é analisado em caráter conclusivo nas
comissões da Câmara.
A previsão é que deve ser votado ainda neste
semestre na Comissão de Segurança Pública. Mais recentemente, foi
apresentado o PL 4471/2012, de autoria dos deputados Paulo Teixeira,
Fabio Trad, Delegado Protógenes e Miro Teixeira que cria regras para a
apuração de mortes e lesões corporais decorrentes das ações de
policiais. Esses casos, conhecidos como “autos de resistência seguida de
morte”, passam a ter rito de investigação semelhante ao utilizado em
crimes praticados por cidadãos comuns. Já passou pelas comissões da
Câmara e aguarda votação no plenário, prevista para agosto.
O tema da violência policial é realmente
grave e precisa ser resolvido. Todavia, o Estado que não pode ser
violento mais do que a situação exige, também não pode ser “solidário”
com a violência de quem quer que seja. O Estado não pode ser
convenientemente frouxo, inerte ou cego. O caput do Art. 208 do Código
Penal tipifica como crime “Escarnecer de alguém publicamente, por motivo
de crença ou função religiosa; impedir ou perturbar cerimônia ou prática de culto religioso; vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto religioso”,
sem contar os dispositivos que tratam do ultraje público ao pudor
previstos nos artigos 233 e 234 do mesmo diploma legal.
Estes
dispositivos previstos na legislação penal não são valorizados por
algumas instituições públicas que deveriam fazê-lo valer. Parece haver
um acordo entre manifestantes criminosos e agentes públicos
prevaricadores que garante um salvo-conduto, igualmente criminoso, para
perturbar culto, vilipendiar publicamente ato ou objeto de culto
religioso, ou mesmo a prática de atos imorais em via pública, para
afrontar fiéis que optam por defender valores relacionados à vida e à
família tradicional.
Estes dispositivos legais e os valores
morais caros às famílias brasileiras parecem não ser importantes para
alguns ativistas que usam de suas funções de Estado para “liberar geral”
comportamentos, desde que sejam do lado da promiscuidade sexual ou de
atitudes desta natureza. É um Código Penal que não é erga omnes
(contra todos). Surgiu a prerrogativa de descumpri-lo desde que seja do
lado da imoralidade ou da perversão sexual. Baseado nisto, há um grupo
de manifestantes que possuem um indevido salvo conduto dado pelas
instituições públicas que deveriam atuar em defesa de todos.
Estes
salvos-condutos “legitimados” pela prevaricação de agentes públicos que
se mantêm, de forma indevida, convenientemente inertes, geralmente são
dados para minorias violentas e que atacam moralmente ou até fisicamente
cidadãos que prestam seus cultos que, por sua natureza, são pacíficos.
Os cidadãos religiosos, se cometem
deslizes, são disputados pelas mídias e pelas instituições do Estado que
querem mostrar o quão viscerais são contra os desvios de conduta.
Agentes públicos que possuem prerrogativas amplas, robustas e vitalícias
para defender a sociedade como um todo, por vezes, usam tais proteções
constitucionais para terem à sua disposição um cardápio que lhes permite
escolher sua “vítima” preferencial. Tais mídias e instituições,
desviadas também de suas funções, omitem-se oportunamente sem cerimônia,
sem vergonha, sem perder a pompa nem as prerrogativas, e sem riscos de
serem responsabilizadas pelo sórdido silêncio de um Estado que busca ser
laico, mas não se incomoda de ser visto como vadio.
Ser vadio ou vadia,
parece ser uma excludente de ilicitude ou de punibilidade, enquanto ser
religioso um tipo penal de um Estado cujas prioridades de Justiça
prestigiam, além dos interesses “vadios”, os de ricos e de repercussão
midiática.
"As opiniões ditas pelos colunistas
são de inteira e única responsabilidade dos mesmos, as mesmas não
representam a opinião do Gospel+ e demais colaboradores."
Nenhum comentário:
Postar um comentário