Psicologia Sem Ideologia
Em defesa da ciência e da profissão
“Fala-se dos homossexuais. Trata-se dos homossexuais. Não se curam
os homossexuais. E o mais impressionante é que não são curados, a despeito de
serem absolutamente curáveis” (Jacques Lacan, Seminário ‘As formações do Inconsciente’,
livro 5, Capítulo XI, pág. 214, ed. Jorge Zahar, 1999)
Suponhamos que a
Psicanálise estivesse regulamentada como profissão no Brasil e seu órgão de
classe fosse à imagem e semelhança do Conselho Federal de Psicologia.
Suponhamos ainda, caro leitor, que o eminente psicanalista Jacques Lacan, uma
vez nascido brasileiro, cá estivesse entre nós, mais vivo do que nunca. Alguém
tem dúvida de que as declarações em epígrafe, feitas durante um de seus
inúmeros seminários, seriam motivo suficiente para atiçar a fúria dos ativistas
LGBTs, deflagrando contra seu autor uma espécie de campanha macarthista? Creio
que não. Com toda certeza, veríamos uma militância radical e facciosa despejar
sobre o hipotético “Conselho Federal de Psicanálise” – doravante designado pela
sigla CFP – uma saraivada de protestos, denúncias e representações
disciplinares, algo capaz de infernizar a vida de qualquer profissional
consciencioso.
Imagine a cena kafkiana:
conselheiros do CFP se reúnem às pressas num gabinete cor-de-rosa da capital
para redigir censura pública contra um dos maiores psicanalistas do século XX!
Como qualquer pessoa razoável, você deve estar se perguntando de que autoridade
intelectual ou moral se valem esses conselheiros, e se existiriam de fato
motivos plausíveis para punir o psicanalista. Alguma heresia? Algum pecado
capital? Algum delito de opinião? Nada disso. A grande encrenca de Jacques
Lacan é que sua opinião sobre a “cura gay”, certa ou errada, se pauta
unicamente por critérios empíricos, teóricos e/ou clínicos. E se há uma coisa que
os conselheiros, ou melhor, que os “comissários do povo” não podem aceitar, é a
“alienação” de uma “ciência burguesa”.
Na cartilha submarxista
dos comissários, toda e qualquer construção teórica que se atenha aos indícios
e evidências da prática clínica, padece de um vício de origem absolutamente
intolerável. Idéias sem pedigree ideológico não assumem “compromissos
sociais”, não propiciam o engajamento político ou favorecem a “justiça social”.
E não adianta. Por mais que você tente explicar aos comissários que o maior
compromisso social da ciência é produzir conhecimento, eles não querem nem
saber. O negócio deles é afagar ativistas radiais e barulhentos, coisa que
sempre fazem sob o nobre pretexto de defender os “direitos humanos”.
É nessa atmosfera mental
que pronunciamentos como o de Jacques Lacan, independente do mérito científico
que porventura tenham, acabam sendo alvo dos mais variados vitupérios. Como
bons burocratas, os comissários do CFP fogem às discussões teóricas, sobretudo
quando o assunto é complexo e demanda certo esforço intelectual. Para eles, é
mais fácil baixar uma resolução e, usando seu poder de polícia, suprimir
possíveis controvérsias.
A lógica stalinista dos
comissários do CFP funciona como o tribunal da rainha de copas em Alice
nos País das Maravilhas. Se existe uma contenda científica em torno d’algum
tema, eles proferem a sentença por meio de uma resolução, e só depois, quando
se instaura o processo disciplinar, é que vem o julgamento. Eu sei que o método
não é lá muito democrático, mas é o jeito soviético de ser dos nossos
comissários.
Agora, sejamos francos:
existe gesto mais boçal do que “barnabés” de uma repartição pública chamando às
falas um intelectual do porte de Jacques Lacan? Logo ele, um queridinho das
esquerdas, acusado injustamente de “reforçar preconceitos sociais” (vide art.
3º da resolução 01/99),
apenas porque teve a petulância de defender publicamente a tal “cura gay”?
Quanta infâmia, não?!
E se esse
"linguarudo" pensa que seus problemas acabaram, está enganado.
Tão-logo os ativistas gays se dêem conta de que suas mais loucas pretensões
foram averbadas pelo carimbo de um órgão oficial, eles largam o mundo da
fantasia e passam imediatamente ao ato, iniciando uma verdadeira "caça às
bruxas" contra o ilustre psicanalista. Assim, eles se infiltram no seu
consultório, filmam clandestinamente sua prática clínica, jogam sua reputação
profissional na sarjeta, até que o pobre coitado, infectado por uma espécie de
lepra social, perde por completo os meios de subsistência. Quem já não viu esse
filme? Basta lembrar o caso da psicóloga Rozângela Justino, contra a qual foi
perpetrado o maior “assassinato de personalidade” já registrado na história da
psicologia brasileira.
Mas, caro leitor, nem só
de simpatias gayzistas vive nosso hipotético CFP. As teses materialistas e
atéias também despertam afinidades entre os comissários. Embora não cheguem ao
ponto de assumi-las em público, suas tendências niilistas acabam transparecendo
sob a forma atenuada de um discurso laicizante. Com a alegação de que defendem
uma “ciência secular” desde a autoridade de um Estado laico, o CFP crê piamente
que pode impedir psicólogos de professar sua fé ou manifestar adesão a valores
religiosos. Nem precisa lembrá-los de que as garantias constitucionais, válidas
para todos os cidadãos, também se aplicam aos psicólogos. Basta que eles
entendam que, num Estado laico, só quem não pode ostentar preferências
religiosas é o próprio poder público, e não os cidadãos que ele governa. O
mesmo raciocínio se aplica à relação existente entre o CFP e seus associados.
Eu me pergunto, cá com
os meus botões, o que fariam os comissários do CFP se um dia topassem com as
seguintes declarações:
1. “Coisa
alguma da mensagem do Cristo está em contradição com as descobertas
freudianas”
2. “Freud,
sem o saber, estabeleceu uma base empírica de vida que está de acordo com o
ideal cristão.”
Alguém arriscaria um
palpite sobre sua autoria? Quem pensou na psicóloga Marisa Lobo, errou. Tais
declarações partiram de dois renomados psicanalistas, a saber, François Dolto e
Gregory Zilboorg, respectivamente. A primeira delas foi retirada do livro Os
Evangelhos à luz da Psicanálise (Verus editora, 2010) e a segunda, do
livro Psicanálise e Religião (Editora Vozes, 1969). Ambos eram
cristãos professos e escreveram obras com o objetivo de, cada um a seu modo,
estabelecer interseções entre a religião cristã, a mensagem bíblica e a psicanálise.
E fizeram isso, diga-se de passagem, com uma boa dose de criatividade. Mas será
que os comissários do nosso hipotético CFP teriam a audácia de intimar os
psicanalistas cristãos à sede da autarquia, e em seguida ameaçar-lhes com um
processo disciplinar, caso as menções ao cristianismo não fossem retiradas de
suas obras num prazo de 15 dias? Chegariam a tanto? Ninguém se sabe...
O certo é que a tragédia da psicologia
brasileira, como se vê, beira o mais rematado ridículo. Os conselhos de
psicologia, em sua maior parte, foram tomados por uma horda de bárbaros, uma
arraia-miúda cuja mentalidade foi forjada na agitação das passeatas, na
violência dos piquetes e no burburinho dos diretórios acadêmicos. Quanto mais
intelectualmente inepta, quanto mais inculta, tanto mais essa corriola exala
seu fanatismo ideológico. Como não possui argumentos, persegue, intimida
e protesta com gritos e palavras de ordem. Quando dialoga, o faz com
aquela linguagem manietada dos clichês e slogans politicamente
corretos. Enfim, seus atos e pensamentos refletem os paradoxos de uma loucura:
são intolerantes quando clamam por tolerância, totalitários quando defendem a
diversidade, injustos quando reivindicam direitos e autoritários em nome da
democracia. Viva o comissariado do povo!
Fonte: http://psicologiasemideologia.blogspot.com.br/2012/07/normal-0-21-false-false-false-pt-br-x.html
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