IGUALITÁRIOS EM BUSCA DE PRIVILÉGIOS
A notícia da
morte de Steve Jobs, fundador da Apple, consumiu toneladas de papel e
tinta, impregnados de abundantes lágrimas multicoloridas. Nesse
obituário lacrimejante, que ocupava o noticiário juntamente com a crise
financeira internacional e o desemprego crescente, um artigo tinha este
título: Menos
universitários, mais empreendedores. Eu não precisaria ler
o artigo para saber o conteúdo, mas li e gostei.
Depois de
enfileirar numerosos “gênios” do Vale do Silício, que interromperam o
curso universitário para ganhar dinheiro com suas ideias rendosas, o
autor conclui que a solução para o desemprego não passa pela conclusão
de cursos universitários (isso até contribui para aumentar o número de
desempregados qualificados), e sim pelo apoio a empreendedores, tenham
eles frequentado ou não a universidade. E a proposta dele para superar
a crise resume-se em estimular geradores
de empregos, ao invés de formar consumidores de empregos.
Isso me fez exumar do fundo da memória o que me contaram sobre um
encontro de Amador Aguiar (Bradesco) e Moreira Sales (Unibanco). Havia
entendimentos para uma eventual fusão, e agendaram o encontro no Rio,
onde o semi-analfabeto Aguiar foi cerimoniosamente apresentado a uma
equipe de especialistas com PhD nisso e naquilo. Sentaram-se em torno
de uma mesa, e o visitante começou nestes termos:
— Já que vocês
perderam tempo estudando isso tudo, agora vamos aprender a ganhar
dinheiro.
O americano Jobs
e o brasileiro Aguiar pertenciam a um pequeno grupo de pessoas
qualificáveis como empreendedores, e ganharam muito dinheiro com isso.
Estou longe de incentivar o culto ao dinheiro, especialmente quando
esse culto prejudica objetivos muito mais importantes para as pessoas e
a sociedade. Mas os empreendedores, bem ou mal, fornecem o que a
sociedade quer; ou então convencem a sociedade a comprar o que eles
querem vender.
Você certamente
conhece outros exemplos do mesmo tamanho, ou menores, ou até muito
menores. Eu mesmo tenho um tio neste último degrau, que se deu bem ao
interromper os estudos no curso primário, passando a trabalhar por
conta própria. Vale lembrá-lo também para contar a explicação modesta
com que sintetiza o motivo da sua escassa formação escolar:
— Eu até entrei
no estudo, mas o estudo não entrô ni mim.
Tanto no Brasil
como em outros países, muitas pessoas de pouca cultura foram bem
sucedidas em atividades diversas. Isto não quer dizer que o ensino
universitário deva ser reduzido, mesmo porque as empresas dos
empreendedores precisam de técnicos e cientistas qualificados. Os
empreendedores, fazendo o que sabem fazer, geram bons empregos para
estes, que podem assim receber boa remuneração e se incluir entre os
bem sucedidos. Também geram empregos menos bem remunerados para categorias
menos qualificadas. Tanto os empreendedores quanto os estudiosos e os
menos dotados são necessários, e seria insensato excluir ou prejudicar
uns ou outros por haver essas diferenças naturais e os desníveis
sociais delas resultantes.
Aptidões,
características e condições individuais variam quase ao infinito. Tão
evidente isso é, que podemos dispensar argumentos filosóficos e
sociológicos, e ainda assim concluir com segurança que os seres humanos
não podem ser avaliados ou compelidos por uma fita métrica igualitária.
As pessoas simplesmente não são iguais, formando um campo inóspito ao
marxismo. Apesar dessa evidência, comunistas recalcitrantes ainda
insistem nos seus dogmas antinaturais, mesmo após os grandes
sofrimentos e desastres que movimentos igualitários causaram em todo o
mundo.
O interessante
neste assunto é um resultado pouco comentado pelos que analisam a
trajetória do igualitarismo nos vários países. Os revolucionários,
quando estão divulgando e tentando implantar sua ideologia, com o
pretexto de igualdade de direitos e favorecer o povo oprimido,
matraqueiam slogans contra os privilégios. Porém, se conseguem tomar o
poder, um dos primeiros passos é garantir privilégios não igualitários
para eles mesmos. Estão nesta linha as recentes revelações sobre o
suntuoso padrão de vida de Fidel Castro. E não custa lembrar que ele
permanece o grande inspirador e exemplo para muitos terroristas
enfeitados que conhecemos.
Comenta-se sobre gente
dessa grei: Podem chamá-los
de desonestos, de ignorantes, mas burros eles não são. O marxismo e
os seus seguidores de maior coturno têm objetivos muito mais profundos
do que os simples privilégios pessoais. Mas é o caso de perguntar se
essa situação privilegiada, anti-igualitária, não é desde o início um
objetivo camuflado da sua mentirosa propaganda igualitária.
(*) Jacinto Flecha é médico e
colaborador da Abim
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