5 de setembro de 2014
Carlos Bezerra não vai defender os escravos de Cuba?
Thiago
Cortês
O deputado estadual Carlos Bezerra
Jr. (PSDB-SP) é autor de uma lei contra o trabalho escravo moderno que é
comparada, pelas almas generosas, com a própria Lei Áurea.
Leonardo Boff e Carlos Bezerra |
A lei foi sancionada pelo
governador Alckmin e representa um marco
revolucionário na medida em que inviabiliza o funcionamento de empresas a
exploram trabalhadores.
Evangélico, o deputado virou notícia
internacional. Não é por acaso: colocou na berlinda grandes grupos
empresariais como a Zara, que admitiu
a ocorrência de trabalho escravo no processo de fabricação de seus artigos
no ano de 2011.
Bezerra tem minha simpatia por sua
corajosa iniciativa. Até mesmo porque sua lei beneficia principalmente gente
como bolivianos ilegais que sequer têm título de eleitor. É raro ver um
político evangélico que não se limita a agir como despachante de igreja.
O que me causa estranheza é o
gritante silêncio do deputado em relação à situação dos médicos cubanos do
famigerado programa Mais Médicos, cujos
direitos trabalhistas foram ignorados em favor de uma parceria obscura
entre o Brasil e uma ditadura.
O procurador
do Ministério Público do Trabalho, Sebastião Caixeta, classificou a
iniciativa federal de irregular, pois descumpre as leis trabalhistas
brasileiras. Segundo ele, não estão previstos nos contratos dos cubanos o
pagamento de férias remuneradas e de 13º salário.
“…há
um desvirtuamento do que é uma autêntica relação de trabalho. Portanto, há
descumprimento dos direitos de índole trabalhista previstos na Constituição.
(…) O texto do projeto de lei do Mais Médicos diz que não há remuneração, mas
um auxílio por meio de bolsa. Todo o programa é estruturado no sentido de
afastar a relação de emprego, mas, na prática, essa relação de emprego existe”
O
procurador deu tal declaração após participar de audiência com a médica
cubana Ramona Rodriguez, que desertou – do programa e do País – em busca de
seus direitos. Ramona denunciou que recebia apenas US$ 400 (cerca de R$ 968).
Outros US$ 600 (R$ 1.452) seriam
depositados em Cuba e só poderiam ser sacados no seu retorno ao país. O
restante — R$ 7.580 — vai direto para a ditadura dos irmãos Castro.
Em outras palavras, os médicos
cubanos recebem apenas 20% do que o Brasil repassa a Cuba.
Carlos Bezerra se levantou contra
gigantes empresariais que submetem imigrantes ilegais à lógica da exploração
sem lei, mas nada disse sobre os médicos cubanos que têm seus direitos
trabalhistas negados porque estão submetidos à lógica de exploração de uma
ditadura.
Assim como os bolivianos ilegais,
os profissionais de Cuba estão vivendo bem aqui, em território brasileiro, sob
égide da Constituição Federal. É estranho que o deputado evangélico que lutou
pelos direitos dos primeiros tenha se esquecido dos segundos.
O jurista Ives Gandra, uma
das maiores referências do campo jurídico do Brasil, não hesitou em classificar
o regime de trabalho dos médicos cubanos de “neoscravagismo”:
“O
governo federal oferece para todos os médicos estrangeiros “não cubanos” que
aderiram ao programa Mais Médicos um pagamento mensal de R$ 10 mil. Em relação
aos cubanos, todavia, os R$ 10 mil são pagos ao governo da ilha”
Além da exploração brutal, Ives
Granda lembrou que o contrato do programa determina que os profissional cubano
só poderá receber visitas de amigos ou familiares no Brasil, mediante
“comunicação prévia à Direção da Brigada Médica Cubana” aqui sediada.
O contrato determina ainda “estrita
confidencialidade” sobre qualquer informação que receba em Cuba ou no Brasil
até “um ano depois do término” de suas atividades. Diante dos fatos, o jurista
concluiu:
“O
governo federal, que diz defender os trabalhadores –o partido no poder tem esse
título–, não poderia aceitar a escravidão dos médicos cubanos contratados, que
recebem no Brasil 10% do que recebem os demais médicos estrangeiros”
O artigo de Ives Gandra foi
publicado na mesma Folha de S. Paulo na qual Carlos Bezerra havia publicado um
texto primoroso, “O Brasil sob a chibata”, falando da importância da luta
contra a escravidão no mundo contemporâneo:
“A
exploração do trabalho escravo é um crime tipificado de forma objetiva em leis
conhecidas e largamente aceitas pelos tribunais brasileiros. A legislação leva
em conta um conjunto de situações: servidão por dívidas, restrição da
locomoção, trabalhos forçados, jornada exaustiva e condições degradantes de
trabalho”
Ora, o contrato ao qual estão
submetidos os médicos cubanos estipula
que eles não podem frequentar locais públicos sem prévia autorização. Eles não
podem sair depois das 18 horas sem a permissão do seu chefe imediato. Para
requerer tal “regalia” o profissional deve informar aonde irá, se irá com
companheiros cubanos ou nativos.
Pergunto ao deputado Carlos
Bezerra: isso não seria “restrição de locomoção”?
No documento citado por Ives Granda
também é possível saber que até mesmo o casamento com um não cubano estará
sujeito à legislação cubana, a não ser que haja “autorização prévia por
escrito” da referida máxima direção cubana.
É bastante visível que os
profissionais de Cuba que trabalham no Brasil realmente estão vivendo uma
situação de “neoescravagismo”, como bem definiu Ives Granda.
Infelizmente o deputado brasileiro
mais ligado a temática da escravidão moderna nada disse sobre isso. Só me resta
especular os motivos:
1-
Porque é politicamente incorreto criticar Cuba
2-
Para não desagradar os irmãos progressistas
3-
Por falta de coragem mesmo
Mas são apenas especulações e
espero, de todo o coração, estar totalmente enganado. Talvez o deputado Carlos
Bezerra possa nos iluminar com um motivo nobre para o seu silêncio ou, melhor
ainda, possa quebrar esse silêncio, de forma corajosa e humilde, legitimando a
sua causa com a imparcialidade.
A médica cubana citada acima havia
sido “denunciada” por ter cometido o “crime”
de namorar e foi praticamente chamada de bêbada por um deputado petista. O
caso teve repercussão internacional e pouca gente se colocou ao lado da
trabalhadora cubana.
Assim como pastores progressistas
que vivem falando em direitos humanos e acusando Alckmin de fascismo, Bezerra
nada disse sobre o flagrante abuso da privacidade de Ramona e o tratamento
desrespeitoso que a trabalhadora recebeu.
Até mesmo um autor
de novelas da Rede Globo se compadeceu dos trabalhadores cubanos, mas os
evangélicos prafrentex não conseguiram ir além da ideologia e fazer a coisa
certa.
Certa feita, o deputado Carlos
Bezerra disse que não
se alinha a “bancadas evangélicas”, mas nessa questão particular está
exatamente no mesmo patamar dos seus colegas.
De qualquer forma, enquanto os
médicos cubanos permaneceram submetidos – em território brasileiro – a um
regime de trabalho semelhante à escravidão, coagidos pela legislação absurda
de uma ditadura estrangeira, continuarei denunciando o silêncio vergonhoso
de Carlos Bezerra Jr e dos demais políticos evangélicos.
Fonte:
GospelMais
Divulgação:
www.juliosevero.com
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