MÍDIA SEM MÁSCARA
ESCRITO POR JOHANN HARI | 04 SETEMBRO 2012
ARTIGOS - MOVIMENTO REVOLUCIONÁRIO
Com a exceção de Jean-Marie Le Pen, praticamente todos os fascistas europeus do alto escalão dos últimos 30 anos são gays. É hora de admitirmos algo: o fascismo não é algo que acontece lá fora, um hábito adquirido por garotos heteros. Ele é – pelo menos em parte – uma coisa gay.
A notícia de que Jorg Haider – um líder fascista austríaco – despendeu parte das horas finais da sua vida com um fogoso homem loiro chocou algumas pessoas. Isso não me deixou chocado. Esse assunto é um tabu para um homem gay de esquerda como eu tratar, mas sempre houve uma estranha e desproporcional correspondência entre homossexualidade e fascismo. Respire fundo; aqui vai.
Algo próximo de 10 mil gays foram mortos nos campos de concentração nazistas. Outros tantos foram humilhados, presos, deportados, castrados ou vítimas de uma limpeza étnica. Um sobrevivente gay dos campos, LD Classen von Neudegg, relatou em escrito suas experiências. Uma pequena amostra: “Três homens tentaram escapar uma noite. Eles foram capturados e, quando foram trazidos de volta, tiveram a palavra “homo” rabiscada por toda a roupa. Eles foram colocados em um bloco do campo e chicoteados. Então eles foram forçados a tocar um tambor e dar vivas: “Hurrah! Estamos de volta! Hurra!”, e logo após foram enforcados”. Das histórias documentadas no livro, essa é uma das mais brandas.
Desse modo, a ideia de um gay fascista soa ridícula. Ainda assim, quando o Partido Nacional Britânico (PNB) [British National Party] – a nossa versão doméstica dos fanáticos negadores do Holocausto – anunciou que estava colocando no páreo um candidato abertamente gay nas eleições europeias em junho, os dedicados seguidores do fascismo absolutamente não se abalaram. A verdade, que fora até então distorcida, é que os homens gays sempre estiveram no cerne de todos os grandes movimentos fascistas que já existiram – incluindo o Terceiro Reich gaseificador de gays e “homocida”. Com a exceção de Jean-Marie Le Pen, praticamente todos os fascistas europeus do alto escalão dos últimos 30 anos são gays. É hora de admitirmos algo: o fascismo não é algo que acontece lá fora, um hábito adquirido por garotos heteros. Ele é – pelo menos em parte – uma coisa gay, portanto, é hora dos gays não fascistas acordarem e encararem a música da marcha.
Preste atenção no nosso próprio continente na última década. O fascista holandês Pim Fortuyn defendeu princípios flagrantemente racistas e etnocentristas quando descreveu o Islã como “um câncer” e “a maior ameaça à civilização ocidental nos dias de hoje”. No entanto ele tinha dois cachorrinhos fofos e um complexo de madame, além de ser alegadamente – e visivelmente – gay. Quando fora acusado por um político de odiar os árabes, ele respondeu, “Como eu posso odiar os árabes? Eu chupei um ontem à noite.”
Jorg Haider reduziu a pó a política austríaca pós-nazista em 2000 quando seu partido neofascista, o “Partido da Liberdade”, ganhou um quarto dos votos e entrou no governo daquele país como um parceiro de coalizão. Sempre surgiram vários fatos sobre ele na imprensa internacional: o queixo quadrado, o torso musculoso, o pai apoiador da SS, o raivoso antissemitismo, o ódio pelos imigrantes, a descrição de Auschwitz e Dachau como “centros de punição”... Alguns jornais mencionaram que ele sempre andava rodeado de homens jovens fanáticos e malhados. Outros foram além e mostraram que vários desses homens jovens eram abertamente gays. Então um jornal de esquerda alemão deu a notícia que todos estavam insinuando: eles alegaram que Haider era gay.
Rumores de um garçom indiano contendo “íntimos detalhes” do corpo de Haider estouraram na imprensa. O diretor do Partido da Liberdade, Gerald Miscka, rapidamente renunciou em meio a acusações de que ele era amante de Haider. Walter Kohler, um amigo gay próximo de Haider – que fora fotografado com uma pistola em coldre enquanto Haider gargalhava – disse ser contra os políticos 'saírem do armário'. Haider – que era casado e tinha dois filhos – manteve-se quieto enquanto seus funcionários negavam o rumor. A revelação de que ele morreu após sair de um bar gay sugere que esses rumores eram verdadeiros.
E assim vai. Se você fizer um passeio pela Europa, apenas parando nos fascistas gays, não haverá muitos lugares para sentir falta. O líder fascista do pós-guerra na França era Edouard Pfieffer, e a espada dele não estava exatamente cortando para o mesmo lado dos heteros. O principal líder neonazista alemão dos anos 80 chamava-se Michael Kuhnen; ele morreu de AIDS em 1991 alguns anos após sair do armário. Martin Lee, autor de um estudo do fascismo na Europa, explica: “Para Kuhnen, havia algo de 'supermacho' em ser um nazista, assim como ser homossexual, ou seja, duas coisas que reforçavam o senso de viver no limite, de pertencer a uma elite predestinada a causar impacto. Ele disse a um jornalista da Alemanha Ocidental que os homossexuais eram 'especialmente adequados para a tarefa, pois eles não tinham laços com esposas, filhos ou família'”.
E não demoraria até sua viagem chegar à Grã-Bretanha. À primeira vista, nossos nazistas parecem militantemente heteros. Eles tentaram acabar com paradas gays, descreveram os gays como “maus” e o líder do PNB Nick Griffin reagiu encantadoramente aos ataques a bomba ao pub Admiral Duncan em 1999 dizendo em uma coluna que “As imagens da TV mostrando os manifestantes gays [do lado de fora da cena da carnificina] ostentando suas perversões na frente dos jornalistas do mundo todo mostraram porque tantas pessoas comuns acham essas criaturas repulsivas.”
Mas arranhe essa superfície homofóbica e então logo verás uma suástica de lycra por baixo. Em 1999, Martin Webster, um ex-organizador do National Front e chefão do movimento fascista britânico, escreveu um panfleto de quatro páginas detalhando seu 'caso' com Nick Griffin. “Griffin pediu para ter relações íntimas comigo”, explicou o abertamente gay Webster; “...no final dos anos 70. Ele era vinte anos mais novo que eu”. Ray Hill, que infiltrou no movimento fascista britânico por doze anos para coletar informações para os grupos antifascistas, disse que tudo isso é bem plausível. A homossexualidade é “extremamente prevalecente” nos altos escalões da extrema direita britânica e, durante um período dos anos 80, metade dos organizadores eram gays, segundo ele.
Gerry Gable, editor da revista antifascista 'Searchlight' explica: “Eu olhei por décadas os grupos nazistas britânicos e essa hipocrisia homofóbica estava lá o tempo todo. Eu não consigo lembrar de qualquer organização da extrema direita que não tem atacado pessoas em razão da sua orientação sexual e, ao mesmo tempo, conter muitos oficiais e ativistas gays”.
O suposto caso gay de Griffins seria mais um na longa tradição fascista britânica. O líder do movimento skinhead por toda a década de 70 foi um bandido louco e musculoso chamado Nicky Crane. Ele foi o ícone de uma onda reacionária contra imigrantes, feministas e o modo de vida hippie dos anos 60. O movimento liderado por ele enfatizava a conformidade em uma norma delimitada e desumanizada que lembrava os movimentos fascistas clássicos; logo Crane se tornou um veterano e líder no National Front. Ah sim, e ele era gay. Antes de morrer de AIDS em meados da década de 80, Crane veio a público e admitiu ter feito vários filmes pornográficos gays. Apenas antes de morrer em 1986 foi permitido a ele participar de uma parada do orgulho gay em Londres, embora mesmo assim ele ainda dissesse ter “orgulho de ser fascista”.
O atrito entre fascistas gays e progressistas britânicos gays culminou raivosamente em 1985, quando o Movimento Skinhead Gay abriu uma boate no Centro Gay de Londres. Várias lésbicas opuseram-se à "invasão" do centro. Elas sentiram que o culto dos "homens de verdade" e a presença de bandidos hipermasculinos estava incitando os sentimentos mais baixos "no local, no movimento gay, onde você menos espera".
Essa Gaystapo tinha um ícone para reverenciar, um Führer alternativo para adorar: o perdido líder fascista gay Ernst Rohm. Junto com Adolf Hitler, Rohm foi um dos pais fundadores do nazismo. Nascido de servidores civis conservadores da Bavária em 1887, a vida de Ernst Rohm começou – segundo ele mesmo – nas trincheiras “heroicas” da Primeira Guerra Mundial. Como tantos que formaram o Partido Nazista, ele ficou excitado e obcecado com o mito homoerótico das trincheiras – heroico, com belos garotos preparados para morrer pelos seus irmãos e pelo país.
Ele emergiu da guerra com uma cicatriz de bala no rosto e uma reverência pela guerra. Como ele mesmo coloca em sua autobiografia, “Como eu sou um homem imaturo e perverso, a guerra e a agitação atraem me mais do que a boa ordem burguesa”. Depois de sair da vida militar, ele tentou sem entusiasmo obter uma posição na vida civil, mas ele estava lá como um peixe fora d’água, um burguês chato. Ele não tinha crenças políticas, apenas preconceitos – particularmente o ódio pelos judeus. O historiador Joachim Fest descreve a geração de Rohm dos alienados, desmobilizados e jovens humilhados pela derrota como “agentes da revolução permanente sem qualquer ideia revolucionária do futuro, apenas um desejo de eternizar os valores da trincheira”.
Foi Rohm quem primeiro percebeu o potencial da caixa de sabão falante chamada Adolf Hitler. Rohm viu nele o demagogo que ele precisava para mobilizar o apoio para o seu plano para destruir a democracia e estabelecer um “Estado Soldado” que governaria sem entraves. Ele apresentou o jovem fascista aos políticos locais e líderes militares; todos conheceram Hitler por muito tempo como o “garoto de Rohm”. O historiador gay Frank Rector diz que “Hitler era em grande parte o protegido de Rohm”. Rohm integrou Hitler ao seu movimento clandestino que planejava derrubar a República de Weimar.
A flagrante homossexualidade de Rohm parece bizarra vista agora, dado o genocídio gay que se seguiu [quando o Nazismo chegou ao poder]. Ele falou abertamente sobre sua inclinação por bares gays e banhos turcos, e ainda assim ele era conhecido por sua virilidade. Ele acreditava que os homossexuais eram superiores aos heterossexuais e viu na homossexualidade um princípio chave da sua proposta de Nova Ordem Mundial Fascista. Como o historiador Louis Snyder explica, Rohm “projetou uma ordem social em que a homossexualidade seria tida como um padrão de comportamento humano de alta reputação... Ele ostentou sua homossexualidade em público e insistiu para que seus comparsas fizessem o mesmo. Ele acreditava que pessoas heterossexuais não eram tão adeptas a intimidação e agressão como os homossexuais, por isso a homossexualidade foi tida com alta estima na SA [Sturmabteilung]”. Eles promoveram uma forma agressiva e hipermasculina de homossexualidade, condenado as “mulheres histéricas de ambos os sexos”, fazendo referência aos homens afeminados.
A crença na superioridade da homossexualidade tem forte tradição na Alemanha e cresceu mais ainda desde a virada do século XIX para o XX em volta de Adolf Brand, editor da primeira revista gay daquele país. Você poderia chamá-los de ‘Transviados do Povo’ [Queer of the Volk]: eles pregavam que os homens gays foram a base de toda as nações e representavam uma elite, a casta guerreira que deve governar. Eles veneravam os antigos cultos guerreiros de Esparta, Tebas e Atenas.
Por várias vezes Rohm fez referência à antiga tradição grega de mandar casais gays para a batalha, pois acreditava-se que eles eram guerreiros mais ferozes. A famosa passagem de Termópilas, por exemplo, que foi defendida por 300 soldados – considerados 150 casais gays. Em seus primeiros anos, a SA – o exército clandestino de Hitler e Rohm – era visto como predominantemente gay. Rohm designou seus amantes para os postos proeminentes, fazendo de Edmund Heines seu delegado e Karl Ernst o comandante da SA em Berlim. A organização às vezes se reunia em bares gays. O historiador da arte gay Christian Isermayer disse em uma entrevista: “Eu conheci pessoas da SA. Eles costumavam fazer festas da pesada mesmo em 1933... Cheguei a ir a uma. Estava muito bem-comportada, mas tremendamente gay. Mas nesses dias a SA era ultra-gay.”
Em 30 de junho de 1934, Rohm foi acordado em um hotel berlinense pelo próprio Hitler. Ele se pôs de pé e saudou, “Heil Mein Führer!”, e em resposta Hitler disse: “Você está preso” e assim ele foi retirado de lá do jeito que estava e fora enviado para a prisão de Standelheim. Naquela noite ele foi executado; Rohm foi o sujeito de mais alto escalão morto no massacre conhecido como “Noite das facas longas”.
Hitler suspeitava que Rohm estivesse sendo politicamente desleal a ele, mas o assassinato dele começou uma ferrenha perseguição aos gays. Heinrich Himmler, chefe da Gestapo, descreveu a homossexualidade como “um sintoma de degenerescência que poderia destruir nossa raça. Precisamos voltar aos princípios orientadores dos nórdicos: exterminação dos degenerados”.
O historiador alemão Lothar Machtan argumenta que Hitler matou Rohm – e boa parte dos figurões da SA – para silenciar a especulação sobre suas próprias experiências homossexuais. As ‘evidências’ do historiador sobre Hitler ser gay não são sólidas e tem sido questionadas por vários historiadores, embora algumas descobertas são, pelo menos, sugestivas. Um amigo próximo de Hitler da época da adolescência, August Kubizek, alega um caso ‘romântico’ entre eles. Um mensageiro militar que serviu junto de Hitler na Primeira Guerra Mundial, reivindicou ter visto Hitler manter relações sexuais com outro homem. Hitler era de fato próximo a vários homens gays e, aparentemente, nunca teve uma relação sexual normal com um uma mulher, inclusive sua esposa Eva Braun.
Rudolph Diels, fundador da Gestapo, não esqueceu alguns dos pensamentos particulares de Hitler sobre a homossexualidade: “Ele afirmou que isso [a homossexualidade] destruiu a Grécia antiga. Uma vez disseminada, ela estende seus efeitos contagiosos como uma inevitável lei da natureza mesmo aos melhores e mais masculinos caráteres, eliminando da procriação os homens que o povo [Volk] mais precisa”. Essa ideia de que a homossexualidade é ‘contagiosa’ e, implicitamente tentadora, é reveladora.
Rohm é venerado nos sites homo-nazi que surgiram internet afora como vermes numa ferida. Eles têm nomes como Gays Against Semitism [Gays Contra o Semitismo] (com o charmoso acrônimo GAS) e Aryan Resistance Corps [Corpo de Resistência Ariana] (ARC). A filosofia ‘rohmnita’ deles é simples: enquanto homens brancos são superiores às outras raças, homens gays são os “mestres da Raça Mestra”. Apenas eles receberam a “capacidade de se relacionarem apenas com homens” e o “intelecto superior” necessário a “uma revolução fascista”. A ARC até mesmo organiza fins de semana de “encontros” para que seus membros possam “relaxar na companhia dos seus outros companheiros brancos”.
Deste modo, fica fácil concordar que os gays não foram contaminados pelo fascismo. Na verdade, boa parte do tempo eles estiveram no âmago dele. Isso suscita uma questão maior: Por quê? Como podem os gays – que na maior parte do tempo são as vítimas da opressão e do ódio – tornarem-se integrantes do mais odioso e maldoso movimento político que já existiu? Seria isso uma forma extrema de autoflagelação, um equivalente político ao garoto que corta os próprios pulsos por conta do ódio por si mesmo?
O ator e diretor de filmes gays pornográficos, Bruce LaBruce, tem uma explicação. Ele reivindica que “toda a pornografia gay dos dias de hoje é implicitamente fascista. O fascismo está nos nossos ossos, pois é sempre a respeito de glorificar a supremacia do homem branco e fetichizar a dominação, crueldade, poder e figuras monstruosas de autoridade”. Ele tentou explorar a relação entre homossexualidade e fascismo em seus filmes, começando com ‘No Skin Off My Ass’ de 1991. Em seu perturbador filme de 1999, ‘Skin Flick’, um casal gay burguês – composto por um branco e um negro – são sexualmente aterrorizados por uma gang de skinheads gays que se masturbavam com o ‘Mein Kampf’ e que batiam nos gays passivos. Ele deixou implícito que as normas gays burguesas facilmente se desmoronam para dar lugar a um fascismo que até então era apenas latente; o filme acaba com o personagem negro sendo estuprado na frente do seu amante branco parcialmente excitado, enquanto a gangue racista canta “fodam o macaco”.
Eu decidi rastrear alguns fascistas gays e perguntar a eles diretamente. Wyatt Powers, diretor da ARC disse: “Eu sempre soube no meu coração que ser racista e gay era moralmente certo. Eu não vejo conflito algum entre os dois. É apenas essa mídia sionista que tenta nos convencer de que esse racismo é a mesma coisa que a homofobia. Você pode ser extremamente nacionalista e gay sem qualquer contradição alguma”.
Um comentário em um fórum gay na internet vai além na insanidade racista. Um homem gay de Ohio diz que
“Mesmo se você for branco e gay, ou retardado gay, VOCÊ É BRANCO E ACABOU! Em vez de deixar a raça branca ser extinta por conta de outras raças desprezíveis, tais como os africanos ou os mexicanos, que literalmente brotam milhões de bebês por dia, nós precisamos lutar contra essa porcaria bagunçada que eles estão fazendo. Eles estão estuprando nosso país”.
É verdade que o racismo e a homofobia não são a mesma coisa, mas como o rabino Bernard Melchman explica, “a homofobia e o antissemitismo corriqueiramente são sintomas da mesma doença”. Racistas na maior parte das vezes são homofóbicos. Mesmo após ler toda essa verborragia na internet, eu não me senti próximo de entender por que tantos homens gays aliam-se com pessoas que sempre se voltarão contra eles no final, assim como os nazistas fizeram.
O veterano dos direitos gays Peter Tatchell tem uma explicação inteligente e intrigante. Segundo ele, “há muitas razões para esse tipo de coisa. Uma delas é por conta de parte deles viverem em negação. Eles estão indo para o caminho da hiper masculinidade, o meio mais extremo possível de ser um homem. É um modo de jactantemente rejeitar a visível afeminação de ‘outro’ homossexual. Esses homens problemáticos têm uma crença simples na cabeça: ‘Homens héteros são durões; Bichas são fracotes; Portanto, se eu for durão, eu não posso ser uma bicha’. É um modo desesperado de provar a masculinidade”.
A revista ‘Searchlight’ – a bíblia do movimento anti-fascista na Grã-Bretanha, com infiltrados em todos os movimentos expressivos de extrema direita – oferece uma explicação alternativa. “Geralmente condenados por uma sociedade que continua a ser amplamente hostil aos gays, alguns homens buscam refúgio e um novo status de poder na extrema direita”, disse um dos colaboradores da revista. “Por meio da fidelidade política mostrada pelos grupos fascistas, uma nova identidade emerge – a de que não existem excluídos, pois eles são Homens Brancos, superior a todos os outros. Eles proporcionam ao gay a visibilidade de parte da sua identidade – ou rejeitam as partes socialmente menos aceitáveis, como, por exemplo, ser afeminado – enquanto se gabam daquilo que sobra como superior”.
Mas ainda há outra importante questão: os movimentos fascistas irão inevitavelmente virar-se contra os gays? No caso dos nazistas, parece ter sido algo bem arbitrário; O principal motivo pelo qual Hitler assassinou Rohm não estava relacionado à sua sexualidade. Da minha perspectiva progressista de esquerda, o fascismo é totalmente mau; mas deveriam todos os gays verem o fascismo como inimigo dos seus interesses? É possível existir um fascista gay que não estava agindo contra seu próprio interesse? O fascismo é frequente definido como “uma ideologia política que advoga em causa de um governo hierárquico que sistematicamente nega a igualdade a certos grupos”. É verdade que essa hierarquia poderia beneficiar o gay em detrimento de, digamos, os negros. Mas dada a prevalência da homofobia, não é esse – mesmo para as pessoas que não veem o fascismo como algo inerentemente mau – um perigoso risco a se correr? Uma cultura que se torna violentamente a favor de uma minoria não acaba se virando contra os gays no final? Essa parece, em última análise, a lição da esquálida e miserável vidinha de Ernst Rohm.
A crescente evidência do papel desempenhado pelos gays nos movimentos fascistas foi abusada por alguns homofóbicos. Em um amalucado trabalho de história revisionista chamado ‘A Suástica Pink’, o ‘historiador’ Scott Lively tenta culpar os gays por todo o Holocausto, e descreve os assassinatos de homens gays nos campos de concentração como mera “violência entre gays”. Um emblemático site comentando sobre o livro reivindica de modo absurdo que “A Suástica Pink mostra que há muito mais brutalidade, estupros, torturas e assassinatos de pessoas inocentes cometidos por nazistas homossexuais do que jamais teve contra os próprios homossexuais”.
Contudo, não podemos permitir que esses loucos evitem um período de séria autorreflexão do movimento gay. Se Bruce LaBruce estiver certo, muitos dos principais elementos da cultura gay – culto ao corpo, louvor ao forte, fetiche por figuras de autoridade e crueldade – dão espaço para o vírus fascista se infiltrar. Será que alguns gays realmente precisam ainda aprender que os fascistas não irão trazer uma Fabulosa Solução para os gays, mas uma Solução Final para todos nós?
Johann Hari é colunista dos jornais esquerdistas Huffington Post e The Independent. Gay, se diz secularista e ateu.
Publicado no Huffington Post.
Tradução: Leonildo Trombela Junior
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