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segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Da inversão de valores, o duplipensar e a defesa dos ideais

 

MÍDIA A MAIS

08 | 09 | 2012

Locke: liberdade

 

Por: Maria Júlia Ferraz

Certo dia, cuidando da correspondência eletrônica do site, deparei-me com um leitor que comentava quão monstruosas eram as coisas que publicávamos.

Sempre soube que algumas ideias defendidas por perspectivas não esquerdistas nem sempre eram bem-vindas. Mas a expressão chamou-me a atenção.

Padeço do mal da reflexão. Não exatamente como sugeria Descartes e sua dúvida metódica, mas próxima disso. Dessa forma, o cogito ergo sum (Penso, logo existo) tem a função de  me deixar espantada diante da vida, dos fatos e me impedir de ser escrava de ideologias, frases, crenças só por serem referências de grandes intelectuais.

Assim, fui em busca das monstruosidades que publicamos. E não estou sendo irônica. Fui tentar ver com outros olhos o que se publica aqui, afinal, acostumamos a perspectivas, ângulos, ideias... mas, acima de tudo, alteridade é um exercício de sabedoria.

De forma geral, é possível perceber que os clippings têm a marca dos redatores, os artigos assinados as peculiaridades de seus autores, mas os assuntos tratados não sugerem genocídio, nem obediência cega e servil, muito menos pedofilia, tortura, nenhum tipo de perseguição religiosa ou sexismo.

Pelo contrário, partilham da ideia elaborada por Locke ainda no século XVII, que atribuía ao homem o direito à vida, à liberdade e à propriedade.

Se o que publicamos não incentiva nenhuma prática negativa, ter pessoas que confundem posturas anti-esquerdistas com monstruosidades revela que estamos em um momento em que a inversão de valores ou (pior ainda!) o duplipensar é tão arraigado que defender valores ocidentais é passível de crítica!

Para que outras pessoas possam refletir sobre isso, elaborei uma breve e modesta lista de exemplos de valores monstruosos que defendemos:

- Direito à vida: Sim. Somos contra o aborto. A ideia de que a mulher é dona de seu corpo e deve ter o direito a interromper uma gravidez é magnânima demais para nós. Cometemos a monstruosidade de acreditar que o direito de nascer é superior aos argumentos feministas.

- Responsabilidade Penal para marginais, independente da idade: Não acreditamos que a idade torne o marginal menos cruel. Aliás, isso não é crença. É só pegar crimes cometidos por “menores infratores”. Há uma lista interminável de fatos que comprovam o quanto a impunidade faz com que esses psicopatas tornem-se cruéis e debochados. O argumento de que é a desigualdade social que gera tais monstros só aprisiona o cidadão de bem. Quem disse que todo cidadão de bem teve infância feliz com papai noel, coelhinho da páscoa e família de comercial de margarina? É importante diferenciar oportunidades de mero oportunismo. A visão romântica propagada por Jorge Amado em seu livro “Capitães de Areia” devia ser criticada e não saudada como exemplo de retrato dos marginais com menos de 18 anos. Por isso, somos contra a proteção exacerbada do ECA.

- Direito à segurança pública de qualidade: com a história dos Direitos Humanos, escrever que as pessoas que cometem crimes merecem punições severas é quase confessar falta de humanidade. Isso faz parte da ideia de que todo criminoso é fruto da desigualdade social. Mesmo argumento do coitadismo que cerca os “menores infratores”. A grande questão é que fica incoerente falar em melhores condições da segurança pública sem existirem leis punitivas eficientes e presídios que tenham como função manter o preso fora de circulação. No entanto, atualmente pensar em melhorias jurídicas é pedir para, dependendo da proposta, apanhar de estudantes e professores de direito, que querem ser os paladinos de uma nova ordem social, teoricamente mais justa. Justa com o delinquente e injusta com o trabalhador.

Esses são alguns dos aspectos.

Há outras inversões. A marcha das vadias é uma temeridade para aquelas que acreditam no valor feminino. Por mais que o nome contenha uma pretensa ironia, a proposta desse tipo de manifestação apenas reforça a visão da mulher como objeto. Acho merecido que nós mulheres ocupemos o mesmo lugar dos homens, ganhemos igual sem precisar ser quase um homem.

Ser mulher é diferente de ser homem. Aliás, que bom! Essa é a ideia!!

Então, não estamos defendendo uma masculinização das mulheres. Nem tampouco o retorno ao tempo em que as mulheres eram vistas como parte do lar (como as gregas “condenadas” ao gineceu). O que contestamos é qual a melhoria em expor os corpos para poder chamar atenção para nossos cérebros e sermos vistas com mais seriedade...

OK, OK. Eu sei que o objetivo inicial era fazer com que não houvesse a culpabilização da vítima em caso de estupro, com aquela velha justificativa: “Eu a violentei porque ela estava com roupa curta.” No entanto, a impressão que fica é que a intenção foi desvirtuada e é o incentivo à alienação de si mesma que está sendo imposta às mulheres.

É interessante até pensarmos que a origem do feminismo como luta para a busca da igualdade é consequência do próprio liberalismo. A esquerda mais ortodoxa nunca colocou a luta da mulher como prioridade, pois a questão para ela era outra. Aliás, tanto para Marx, como para Engels.
Não é a intenção desse texto entrar em um estudo mais aprofundado, mas fica aqui esse detalhe que muitas vezes é desconhecido.

Por todos os argumentos mencionados fica evidente que o duplipensar, a distorção de valores, amarrou o cidadão de bem a visões que, se ele pensar mais detalhadamente, vai perceber que nem sempre seriam as melhores alternativas para melhorias práticas no mundo real.

Como há pouco espaço para que essa reflexão seja feita longe da doutrinação esquerdista, é preciso que todos divulguem as contradições existentes nesses discursos. Por isso, mais que artigos de opinião, livros com teoria são sempre bem-vindos.

As resenhas que aqui publicamos têm essa função, além de incentivar a cultura, claro.

Entre o parecer bom (como já propunha Maquiavel) e o ser bom verdadeiramente há um grande abismo. Talvez isso valha para as aparentes monstruosidades que cometemos. Entre aparentarmos e sermos de fato monstruosos há uma realidade prática que mostra nossa verdadeira face. Que ela possa ser vislumbrada.

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